sábado, 6 de março de 2010

Idadismo – Portugal e os idosos


Idadismo é como racismo ou sexismo, mas desta vez o preconceito está relacionado com a idade, nomeadamente a idade avançada. Infelizmente, Portugal integra-se nas sociedades industrializadas que tendem a desvalorizar as pessoas de idade avançada (superior a 65 anos), onde o seu estatuto social é inferior ao das de meia-idade (entre os 35 e os 65 anos) e ao das jovens (entre os 18 e os 35 anos). Ainda assim, segundo estudos europeus, não é o pior país nesta matéria.




Em Portugal, o modo como os idosos são tratados reflecte uma imagem negativa do envelhecimento. Um exemplo disso é o pictograma dos transportes públicos ou filas de espera: a imagem de um indivíduo curvado com uma bengala. O termo “velhos” é negativo porque estão-lhe sempre associados doença, incapacidade e incompetência. É preferível utilizar outros termos como “idosos” ou “seniores”, uma vez que estes englobam aspectos negativos, mas desta vez também positivos, como sabedoria e tranquilidade.


Então porque existe este estigma em relação aos mais velhos? Os especialistas salientam três factores mais importantes: o primeiro é o facto da maioria destas pessoas não estarem a trabalhar activamente, o que numa sociedade que tanto valoriza a produtividade se traduz numa perda de riqueza e poder. O segundo trata-se da questão de serem um fardo para a sociedade, tendo o estado de assegurar o pagamento de reformas e cuidados de saúde, entre outros. Finalmente o terceiro: o envelhecimento dos outros lembra-nos a inevitabilidade do que nos espera. Todos temem perder a vitalidade, beleza e saúde da juventude e muitas vezes isso traduz-se na negligência às pessoas idosas.


Outro problema dos idosos é que estão mais vulneráveis a sofrer comportamentos negativos. O preconceito está associado a discriminação, que pode assumir-se mais explicitamente, originando violência, ou mais subtilmente, negligenciando (má alimentação, falta de limpeza, perigosas condições de habitação, etc.). Sabe-se até que 40 mil idosos que vivem em suas casas lidam com dificuldades na sua alimentação. Existem outros tipos de abuso, como o financeiro, onde se utilizam dinheiro e bens da pessoa sem o seu conhecimento ou autorização, ou ainda o abandono de idosos, por exemplo nos hospitais ou em suas casas sem qualquer tipo de apoio. Os seus “agressores” são principalmente pessoas próximas, como os cuidadores, companheiros ou filhos. Contrariamente ao que se possa pensar, nem sempre se age intencionalmente: muitas vezes as pessoas que têm idosos a seu cargo simplesmente não sabem como devem agir. Como é óbvio, toda esta violência deixa marcas nas pessoas de idade, não só marcas corporais mas também diminuição da dignidade e auto-estima de cada um.


Sendo assim, o que nos torna diferentes dos outros países? Mundialmente, a China tem uma longa tradição de honra e culto às pessoas mais velhas, onde o respeito se mantém como um valor essencial na família e, em muitos casos, várias gerações vivem juntas na mesma habitação, lideradas pelo membro mais velho. Em Portugal, estão neste momento a ser introduzidas grandes mudanças relativas ao acompanhamento individual de cada utente, quer a nível psicológico quer a nível da sua saúde física. O Instituto de Segurança Social lançou guias de qualidade para os serviços sociais essenciais para a melhoria, ainda que gradual (devido ao aperto financeiro), da oferta social para as pessoas idosas no nosso país. Para além disso, já é visível a sua grande participação em universidades seniores.

A psicóloga Síbila Marques, investigadora na área da acção social, elaborou uma tese que procura compreender como a activação de diferentes conteúdos de estereótipo associado ao envelhecimento pode influenciar as percepções e comportamentos na saúde dos idosos. Em termos gerais, o objectivo consistia em colocar as pessoas idosas num “cenário” fictício em que são activadas imagens mais positivas ou mais negativas do envelhecimento. Os resultados da actividade foram muito surpreendentes: quando se utilizava um panfleto, para apresentar uma instituição, com uma imagem “positiva” das pessoas idosas, os inquiridos apresentavam significativamente mais bem-estar, menor percepção de risco de doença e ansiedade. Desta forma, é legítimo concluir-se que a quantidade de estímulos (essencialmente negativos) a que estas pessoas estão sujeitas na sociedade actual, podem afectar o seu desempenho. É por isso que se consideramos as pessoas idosas incompetentes e doentes, elas irão, provavelmente, tornar-se incompetentes e doentes.

Quando pediu às pessoas idosas que realizassem uma tarefa muito difícil (contar para trás a partir de cem em três minutos), a investigadora confessa ter sido afectada por pensamentos “idadistas”, uma vez que estava convencida de que os inquiridos não estavam aptos para a concretizar. Resultado: dos sessenta que participaram, não houve um que fosse incapaz de realizar a tarefa.

O que é facto é que fazia falta em Portugal um Instituto de Estudos para o Envelhecimento (IEE), como o que acabou e ser inaugurado, uma vez que terá um papel importante ao nível da caracterização da realidade dos idosos em Portugal e na mudança das atitudes idadistas prevalecentes na nossa sociedade. Para além de isto, a formação nas escolas poderá ser uma forma adequada de intervenção precoce.

Sempre que pensamos nas viagens que não fizemos, nos livros que não lemos, nos momentos com os netos, no descanso que não tivemos, ocorre-nos que, reformados, haverá tempo para tudo isso, mas a verdade é que o que não faltam são idosos deprimidos, desocupados e sozinhos. O nosso modelo social não permite assegurar uma qualidade de vida adequada aos cidadãos nos seus últimos anos de vida. Até porque mesmo que queiramos regressar ao mercado de trabalho, encontramos sempre as portas fechas. Somos sempre considerados demasiado “velhos” neste mercado capitalista e idadista.

Fazendo agora uma associação entre jovens e idosos, como podem e devem eles assegurar a “dignidadeda sua velhice? Planeamento e poupança são fundamentais desde a infância. Contudo, identificam-se razões para a ausência de comportamentos de poupança dos portugueses, como é o caso da confiança no sistema de segurança social público - não querem sacrificar o bem-estar presente por um destino que ainda vem longe, o que mostra que ainda não há uma consciência clara do problema que se nos avizinha. Se pensarmos num futuro negativo, temos mais dificuldade em poupar. Se o futuro se nos afigura positivo, mais facilmente planeamos o nosso envelhecimento.



Como se pode ver, muitos de nós são idadistas. Mesmo sem querer, o perconceito está intrínseco na nossa sociedade, é inevitável. Por isso, cabem-nos as tarefas de actuar e pensar que esta parte de população merece o nosso apoio e consideração. Já chega de fechar os olhos!






Por isso já sabes, está atento!

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